Disputa entre EUA e China favorece soja do Brasil, prêmios disparam após tarifas

Por Roberto Samora e Ana Mano

SÃO PAULO (Reuters) – O anúncio da China de impor tarifas a produtos norte-americanos vai impulsionar as vendas do agronegócio da América do Sul, especialmente da soja do Brasil, potência agrícola que está em melhor situação para atender os chineses em meio a uma colheita recorde, disseram operadores e analistas nesta quarta-feira.

Os especialistas ressaltaram que isso significará preços firmes para os produtores brasileiros e prêmios elevados para a soja do Brasil, ponderando que a região não conseguirá suprir todos os volumes demandados pela China para eventualmente substituir produtos norte-americanos que percam competitividade pela tarifa.

Em níveis recordes, os prêmios nos portos para a soja do Brasil, maior exportador global do produto, subiram mais ante os contratos futuros de Chicago nesta quarta-feira, atingindo 1,74 dólar por bushel em Paranaguá, alta de 47 centavos ante terça-feira, segundo dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea).

“Em dez anos de agronegócio, eu nunca vi um prêmio tão alto em toda a história, isso de certa forma mais do que compensa esse banho de sangue em Chicago”, afirmou o analista Aedson Pereira, da consultoria agrícola IEG-FNP, referindo-se às perdas na bolsa norte-americana nesta quarta-feira após o anúncio chinês.

O contrato maio da soja em Chicago fechou em queda de 22,75 centavos, ou mais de 2 por cento, a 10,1525 dólares por bushel, mas ainda acima da mínima da sessão de 9,8350 dólares.

A queda nos preços em Chicago ocorreu após a China responder rapidamente nesta quarta-feira aos planos da administração de Donald Trump de adotar tarifas sobre 50 bilhões de dólares em bens chineses, retaliando com uma lista de taxas similares sobre importações dos EUA.

A soja foi vista como uma das maiores armas da China na guerra comercial com os norte-americanos.

EFEITO

O analista Terry Linn, da Linn & Associates, em Chicago, comentou que o anúncio da tarifa é “sazonalmente conveniente” para os chineses, uma vez que uma grande safra do Brasil está chegando ao mercado.

Ele disse esperar alguns cancelamentos de compras de soja dos EUA pela China, enquanto disse que há rumores de que europeus estão cancelando aquisições do Brasil e mudando para a soja dos EUA, tentando fugir dos prêmios mais altos nos portos brasileiros.

“Os prêmios brasileiros decolaram hoje. Parece que a China está vindo para a soja do Brasil, mas o efeito de o Brasil focar exportações para a China é que outros parceiros estão olhando o grão norte-americano com um importante desconto, e estão conseguindo negócios”, disse Linn.

Segundo a analista da INTL FCStone Ana Luiza Lodi, no geral, os prêmios no Brasil tenderiam a subir até o limite comparável de se comprar dos EUA, já considerando o imposto de 25 por cento aplicado pelos chineses.

Ela lembrou que os chineses compraram 53,8 milhões de toneladas de soja brasileira de um total de 68,15 milhões de toneladas que o Brasil exportou em 2017. Ao todo, os chineses compraram mais de 95,5 milhões de toneladas de todas as origens no ano passado.

Segundo ela, os chineses ainda precisariam buscar outros fornecedores para mais de 40 milhões de toneladas de soja de sua demanda, com destaque para os EUA, uma vez que as exportações da Argentina são relativamente mais baixas, com o país focando no esmagamento interno e exportações do farelo de soja, e após uma severa quebra de safra.

“No limite, considerando que a China fosse o destino de toda a exportação de soja brasileira, estimada em 69,5 milhões de toneladas em 2018 pela INTL FCStone, ainda faltariam cerca de 30 milhões de toneladas da oleaginosa para atender a totalidade das importações chinesas. Dessa forma, não teria como deixar de importar soja dos EUA”, comentou Ana Luiza.

Já a IEG-FNP avalia que as exportações brasileiras poderiam até mesmo superar a estimativa de 70 milhões de toneladas.

“Tem potencial para ir mais um pouco (acima de 70 milhões)”, acrescentou Pereira, lembrando que há alguns limites, como a maior demanda por soja para a produção de biodiesel no Brasil, após a mistura no diesel passar de 8 para 10 por cento, neste ano.

Já havia a expectativa de o Brasil exportar volumes recordes de soja em 2018, antes mesmo do anúncio da tarifa norte-americana de 25 por cento, diante de uma quebra acentuada na produção da Argentina, terceiro exportador da oleaginosa após os brasileiros e norte-americanos.

ALTERNATIVAS

A China provavelmente vai ter também que se voltar para a soja do Paraguai e Bolívia, ainda que esses países normalmente tenham menor disponibilidade em relação aos maiores exportadores.

Isso poderia acontecer até o momento em que a China possa eventualmente entrar em um acordo com os EUA, retirando a tarifa da soja.

“A China vai ter que recorrer também a Paraguai e Bolívia, mas mesmo assim não cobriria a carência. Então a gente acredita que esse anúncio mostre que um país vai testar a força do outro, em algum momento isso pode ser negociado entre a China e os EUA”, disse Pereira, da IEG-FNP.

Essa conjuntura, contudo, poderá ser favorável para a expansão de plantio de soja no Brasil, na próxima temporada.

“Querendo ou não, isso é estimulo para produtor brasileiro já começar a pensar na área que ele vai semear em 2018/19”, comentou Pereira.

Fonte: Reuters

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