Credores do agro travam disputas para tomar terras dadas em garantia a CRAs

Decisões judiciais favoráveis a proprietários de terra têm preocupado investidores de títulos do agronegócio e Fiagros; ativos em CRAs somam R$ 145 bilhões

Fazenda
Credores do agro travam disputas para tomar terras dadas em garantia a CRAs |Colheita de soja em Sinop (MT): tribunal negou os pedidos dos credores para que uma produtora de milho e soja entregasse os imóveis dados em garantia em um CRA de R$ 36 milhões(Bloomberg/Victor Moriyama)

Uma decisão judicial na cidade de Sinop, em Mato Grosso, que protegeu as terras de um produtor de milho e soja da apreensão por credores, está repercutindo na Faria Lima.

A decisão trouxe preocupações entre os credores de que pode ser mais difícil do que o esperado tomar terras dadas em garantia nos Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs), um tipo de título de dívida usado para financiar produtores rurais.

Em meio ao aumento dos pedidos de recuperação judicial no campo por causa de queda de preços da soja e milho, os credores se deparam com a perspectiva de ter de travar disputas custosas e prolongadas na Justiça para tentar executar garantias.

O impacto pode ser significativo. Em 31 de julho, os investidores brasileiros tinham cerca de R$ 145 bilhões em CRAs, de acordo com o provedor de dados Uqbar.

Os títulos geralmente oferecem aos agricultores melhores condições do que os empréstimos bancários tradicionais, enquanto os investidores de varejo cobiçam esses papéis por causa da isenção de impostos.

CRAs são normalmente lastreados por imóveis e outros ativos em uma estrutura que permite que os credores mantenham a propriedade da terra até que a dívida seja totalmente paga, a chamada alienação fiduciária.

No entanto, esse tipo de lastro foi suspenso quando um tribunal de Sinop negou os pedidos dos credores para que a produtora de milho e soja Agropecuária Três Irmãos Bergamasco entregasse os imóveis dados em garantia em um CRA de R$ 36 milhões.

A empresa argumentou com sucesso que, como a terra é um bem essencial para seus esforços de produção, ela deve ser protegida da apreensão durante o período de recuperação judicial.

O período inicial de 180 dias da recuperação judicial expirou, levando os credores, incluindo fundos geridos pela Galapagos Capital e SFI Investimentos, a conseguir colocar a terra para leilão. Mas a Três Irmãos ainda tem a opção de pedir mais seis meses de proteção contra os credores, o que pode bloquear a venda.

Outras empresas agrícolas, incluindo a North Agro Agropecuária, buscam a mesma estratégia de argumentar que a terra em alienação fiduciária é um bem essencial e não pode ser tomada durante a recuperação judicial.

“Se os credores levarem mais tempo para executar garantias do que o esperado, e se eles tiverem mais custos legais para lidar, eles provavelmente vão encarecer o custo do crédito”, disse Alfredo Marrucho, chefe de pesquisa da Uqbar, especializada em dados sobre securitização. “Eles também buscarão no futuro usar outros tipos de garantias que sejam mais fáceis de acessar.”

Recuperação judicial cresce no agro

Mais de 100 produtores rurais individuais pediram recuperação judicial durante o primeiro trimestre, mais que o dobro dos últimos três meses de 2023 e um aumento de seis vezes em relação ao ano anterior, de acordo com a Serasa Experian.

E mais recuperações judiciais estão a caminho, pois fatores climáticos e colheitas robustas na Argentina e nos Estados Unidos prejudicam os produtores brasileiros, disse Allison Sousa, advogado e especialista em reestruturação da ERS Consultoria & Advocacia.

Bankruptcy Protection Booms in Rural Brazil  | Filings made by individual producers in each quarter
(Serasa Experian)

Esses processos judiciais têm forte impacto sobre os investidores em CRAs, inclusive nos fundos que compram esses papéis, chamados de Fiagros. O fundo Galapagos Recebíveis do Agronegócio e o fundo SFI Investimentos do Agronegócio caíram 35% e 69%, respectivamente, nos últimos 12 meses.

A Galápagos não quis comentar. A SFI não respondeu imediatamente a pedidos de comentários.

Antes do advento dos CRAs no final da última década o setor agrícola brasileiro tradicionalmente tomava empréstimos de bancos, que estavam mais acostumados a renegociar o financiamento e estender vencimentos.

Os agricultores também eram financiados por tradings e empresas de insumos agrícolas por meio de troca de produtos. Esses credores raramente apreendem terras dadas como garantia.

Mas como os CRAs têm de ser marcados a mercado diariamente, qualquer soluço no pagamento da dívida pode desencadear perdas imediatas no papel, deixando os cotistas dos Fiagros, que são negociados publicamente, em pânico.

“Eventos como esse são importantes para o mercado ganhar maturidade e se ajustar”, disse Daniela Gamboa, responsável pela área de crédito da SulAmérica Investimentos. O mercado de CRA ainda tem espaço para crescer “em um setor tão importante para a economia”.

Por: Bloomberg.com

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