Importância da inoculação com bactérias Rhizobium e Bradyrhizobium na produção de leguminosas e o uso do Nitrogênio

Importância da inoculação com bactérias Rhizobium e Bradyrhizobium na produção de leguminosas e o uso do azoto

Por: Joana Rita Carvalho Fernandes, Biotecnóloga e Paulo Rodrigues, , Biotecnólogo

O Nitrogênio é um elemento químico necessário a todos os organismos vivos para a síntese de proteínas, ácidos nucleicos e outros compostos.

No entanto, nenhum ser vivo, a não ser algumas espécies de microrganismos, possui a capacidade de aproveitar o Nitrogênio existente no ar.

Este é um dos paradoxos da natureza.

A atmosfera terrestre contém quase 80% de Nitrogênio molecular (N2) gasoso mas, ao mesmo tempo, este nutriente é considerado escasso nos solos e caro para a alimentação, pois a maioria dos organismos vivos só consegue usar Nitrogênio “fixado” (não gasoso), que é Nitrogênio na sua forma reduzida (em combinação com hidrogênio), na forma de amônia (NH3).

Apesar de ser grande a quantidade de Nitrogênio molecular (N2) presente na atmosfera este não pode ser utilizado pelas plantas, em todo um número ainda não determinado de microrganismos é capaz de o fazer.

São dois os gêneros mais conhecidos de bactérias simbióticas fixadoras de Nitrogênio, capazes de transformar o Nitrogênio molecular em amônia, encontrando-se em associação simbiótica com plantas hospedeiras (leguminosas – quadro anexo), como é o caso do Rhizobium e Bradyrhizobium. Todos os organismos que efetuam a Fixação Biológica do Nitrogênio (FBN), chamados de organismos diazotróficos, são procariotas e recorrem à enzima nitrogenase para realizarem o processo de fixação.

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Rhizobium e Bradyrhizobium – Bactérias fixadoras simbióticas

Rhizobium spp. e o Bradyrhizobium spp., colectivamente conhecidos como rizóbios, são bactérias gram-negativas, com uma estrutura regular e oval, fixadoras de Nitrogênio, que ao infetarem as raízes das plantas hospedeiras (sempre leguminosas) formam nódulos (tumefações) (fig. 3). Estas bactérias mantêm relações simbióticas com plantas leguminosas que não podem viver sem este processo essencial de fixação de Nitrogênio.

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O processo de nodulação inicia-se quando acontece um reconhecimento da combinação adequada, por parte da planta e bactéria, dando-se de seguida a adesão da bactéria aos pêlos radiculares e a invasão destes.

Após a invasão do pêlo radicular vai ocorrer o deslocamento da bactéria para a raiz principal através do canal de infecção (hilo), como podemos verificar na figura 4, no passo (d).

Ao chegar à raiz principal dá-se a diferenciação das bactérias num novo tipo de células-bacteróides, iniciando-se a fixação de Nitrogênio. O processo de divisão das células bacterianas e vegetais é contínuo e resulta na formação de um nódulo maduro.

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Funcionamento do Processo de Fixação Biológica de Nitrogênio

A reação de fixação do Nitrogênio caracteriza-se pela redução do N2 (Nitrogênio gasoso) em formas mais absorvíveis e assimiláveis pelas plantas como o NH3 (amônia solúvel em água) e NO3– (nitratos), que depois entram no processo de fotossíntese da planta para a produção da cadeia de proteínas necessárias, quer para a planta, quer para o rizóbio (fig. 5). Portanto, para que a reação ocorra, é necessário que haja um transporte de electrões, mediado por moléculas aptas a realizá-lo. A enzima nitrogenase presente no rizóbio é formada por duas unidades proteicas, a Ferro-proteína (Fe-proteína) e a Molibdénio-Ferro-proteína (MoFe-proteína), ambas capazes de transportar electrões. Durante a reação de redução do N2 a nitrogenase é auxiliada por uma terceira molécula transportadora de electrões, a ferridoxina (fig. 6). Por aqui se vê a importância que os micronutrientes como o molibdénio podem ter no sucesso da cultura.

As bactérias utilizam parte dos foto assimilados da planta hospedeira para gerar a energia necessária para promover o processo de fixação biológica de Nitrogênio. Por outro lado, a planta beneficia do Nitrogênio fixado pela bactéria para síntese das suas proteínas (relação estritamente simbiótica – fig. 7).

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Rhizobium e Bradyrhizobium nas pastagens e produção de leguminosas – clima temperado e tropical

Dado o papel chave do Nitrogênio para a formação das proteínas e para a vida, a fixação biológica de Nitrogênio (FBN) é considerada, após a fotossíntese, o mais importante processo biológico do planeta.

Se a associação entre os rizóbios e as plantas for eficiente, o Nitrogênio fixado pode suprir as necessidades do vegetal, dispensando o uso de fertilizantes azotados e oferecendo, assim, vantagens econômicas e ecológicas.

Desta forma, a fixação biológica do Nitrogênio permite:

  • o menor uso de adubos azotados, que resulta em poupanças significativas;
  • contribui para o auto-fornecimento do Nitrogênio utilizado para a formação da planta, minimizando desta forma os impactos do Nitrogênio sobre o meio ambiente;
  • o uso de leguminosas como adubos verdes (siderações) eficientes na FBN cede Nitrogênio para a cultura seguinte e melhora as propriedades físicas, químicas e biológicas do solo;
  • aumenta a produtividade, especialmente evidente em solos pobres.

A eficiência das bactérias fixadoras de Nitrogênio, que estabelecem simbiose com leguminosas, e a sua capacidade de sobreviver e formar nódulos no solo depende de fatores genéticos inerentes aos simbiontes e da interação com factores edafoclimáticos.

Como referido, há dois gêneros próximos de bactérias chamadas de rizóbios: o Rhizobium spp. e o Bradyrhizobium spp. O primeiro gênero é característico de plantas leguminosas de clima temperado e é mais eficiente nestas regiões, agrupando o gênero Bradyrhizobium espécies mais resistentes às temperaturas elevadas e afim com plantas de climas tropicais e sub-tropicais.

Um dos factores limitantes à realização da simbiose entre as bactérias rizóbio com leguminosas em condições tropicais é a ocorrência de altas temperaturas no solo, nomeadamente nas camadas superficiais do solo, região onde se concentra a nodulação de leguminosas como o feijoeiro e a soja. As temperaturas elevadas afetam a sobrevivência do rizóbio no solo, o processo de infecção, formação dos nódulos e ainda a atividade de fixação biológica de Nitrogênio. Por este motivo é fundamental que a nodulação seja feita com espécies adaptadas às condições climáticas e que tenha afinidade com as espécies cultivadas.

Para o efeito tenha-se em consideração que no caso da soja a fixação de Nitrogênio só é limitada por temperaturas diurnas acima de 41°C, e estimulada a 36°C, o que ocorre também no caso do amendoim. Já para o trevo e a ervilha a ótima fixação biológica de Nitrogênio é em torno dos 30°C.

Na maioria dos casos as bactérias fixadoras de Nitrogênio são incapazes de crescer abaixo dos 10°C (no solo).

A fixação de Nitrogênio é optimizada, e em alguns casos só é possível, quando uma determinada espécie de leguminosa é infectada pela espécie ou estirpe correta de bactéria.

As estirpes de rizóbio com baixa especificidade simbiótica são mais comuns nos climas tropicais do que em regiões temperadas.

Assim, os gêneros Bradyrhizobium spp. são capazes de nodular diversas espécies de leguminosas comuns nas regiões tropicais.

Seleção e inoculação de bactérias fixadoras em leguminosas

A eficiência da fixação do Nitrogênio pode ser melhorada quando se dá a associação da espécie/estirpe correta de bactéria com a espécie de planta certa (quadro 1).

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Quando num solo as espécies ou estirpes corretas estão ausentes ou em baixa concentração é necessária a inoculação com as espécies corretas, ou mesmo estirpes selecionadas quanto à eficiência, competitividade e adaptação às condições edafo-climáticas locais.

O uso de inoculantes rizobianos específicos em leguminosas tem sido responsável por expressivas economias no custo da produção agrícola, por meio da redução do uso de adubos minerais azotados, advinda dos benefícios do processo da FBN (quadro 2).

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As bactérias selecionadas são vendidas no comércio apenas com o nome de inoculante. O produtor pode comprar o inoculante ou as sementes já inoculadas com espécies selecionadas de bactérias fixadoras de Nitrogênio e, assim, elevar a produtividade da sua cultura.

De sublinhar que, quando se estabelece o par correto bactéria/leguminosa, ou seja, se dá a inoculação com a espécie ou estirpe correta os nódulos formados adquirem, geralmente, uma coloração rosada ao corte (sinal da eficiência da fixação de Nitrogênio), devido à presença da leghemoglobina, uma forma de hemoglobina necessária para fixar o azoto, dando-se a verdadeira simbiose. Quando assim não acontece, e houve nodulação por espécies não indicadas, os nódulos são brancos e na verdade as bactérias estão a absorver nutrientes da planta sem fixar azoto, estabelecendo-se, na verdade uma indesejável situação de parasitismo.

Uma vez que a racionalização do uso de adubos azotados se impõe por razões econômicas e ecologias e as plantas leguminosas são eficientes na produção de proteína de excelente qualidade quer para consumo humano quer animal, o produtor rural deve ter, cada vez mais, maior atenção na racionalização de recursos, abstendo-se ao mínimo uso de Nitrogênio nas culturas de leguminosas, preocupando-se em inocular os seus solos e sementes com as bactérias fixadoras adequadas. Em Portugal os inoculantes podiam ser adquiridos ao Laboratório Rebelo da Silva, porém, empresas como a Fertiprado inoculam as sementes das suas misturas com leguminosas com rizóbios específicos importados. Os antigos Romanos, há mais de dois mil anos, não só sabiam que o uso das leguminosas como adubo verde era altamente benéfico para os solos e para as culturas, como tinham consciência, embora desconhecendo a razão, que as terras que tinham tido leguminosas eram melhores para receber outras leguminosas, dizendo-se que chegavam a levar alguma terra de um terreno para o outro, numa evidente tentativa de “inoculação” e este saber, acredita-se, tenha sido herdado dos próprios gregos. Apesar de tão antigo este saber, no século XXI é, para muitos, uma quase novidade.

Por: Joana Rita Carvalho Fernandes, Biotecnóloga e Paulo Rodrigues, , Biotecnólogo

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