Opção permite adquirir reposição em época de maior oferta e baixa procura.
É fato que a falta de chuvas compromete a oferta e a qualidade dos pastos. E o que temos observado no País, de alguns anos para cá, são períodos de estiagem cada vez mais secos e prolongados, o que acaba afetando o planejamento da propriedade e, consequentemente, o desempenho de bezerros recriados a pasto. Há uma saída, porém. O pecuarista pode optar por recriar bezerros sob regime de confinamento, excelente alternativa para manter o bom desempenho zootécnico durante a seca. É uma estratégia que contribui, também, para encurtar o ciclo produtivo e melhorar a rentabilidade da fazenda. Antes de achar que essa opção é cara, o pecuarista tem de saber a resposta da seguinte pergunta: quanto custa a arroba produzida de um animal recriado a pasto no período da seca?
É inegável que um bezerro desmamado e recriado a pasto somente com suplementação mineral perde peso na seca. Na melhor das hipóteses, um suplemento com ureia servirá apenas para a manutenção do peso que ele apresentava no fim das águas. Segundo pesquisas, o custo fixo de uma propriedade, que envolve depreciação de pastos, cercas, maquinários e mão de obra, entre outros itens, varia de R$ 1 a R$ 1,20/animal/dia. Tomemos como exemplo o custo fixo de R$ 1/cabeça /dia; uma suplementação mineral com ureia a R$ 0,14/cabeça/dia e um período de suplementação de 150 dias. O custo total nesse período de recria de um bezerro a pasto seria de R$ 171. Supondo que tenhamos boa condição de pastagens, que ainda permita um ganho de 100 gramas por dia. Nesse caso, os animais vão ganhar 15 kg em 150 dias, ou seja, meia arroba a um custo de R$ 171. Convertendo o custo para 1@produzida, teremos o valor total de R$ 342 por arroba, mais do que o dobro do valor da arroba do boi gordo negociada na praça de São Paulo no fim de março.
A partir do momento em que o pecuarista se dá conta do elevado custo para se recriar um bezerro a pasto na seca, fica mais fácil discutir alternativas zootécnicas pouco cogitadas, como a recria em confinamento. Há, ainda, várias outras vantagens neste método. Uma delas é imprimir um ganho de peso igual ao obtido no período das águas a pasto, com baixo custo. Se tomarmos como base um bezerro de 7 a 10 meses, desmamado ou comprado em julho, a meta de ganho de peso é de 750 gramas/dia. O período pode variar, dependendo de cada propriedade. No geral, alojamos os animais no fim de julho, permanecendo estes confinados até o início das águas, entre o fim de outubro e começo de novembro – 120 dias, em média.
Na seca, confinamento de bezerros compensa. O objetivo é colocarmos 90 kg de peso vivo, ou 3@, nos bezerros e retornar com esses animais ao pasto quando houver oferta de capim em quantidade e qualidade. Do ponto de vista de redução da idade ao abate, o ganho dessas 3@ nesse período faz diferença, pois, após a engorda a cocho, esses animais voltarão ao pasto pesando entre 9 e 10@. Com bons pastos e manejo adequado, além de nutrição, sanidade, lotação adequada e outros fatores, é possível conseguirmos mais 4,5@ por garrote, de novembro a junho, o que garante que eles voltem ao confinamento em julho do ano seguinte pesando já 14@ e com grande chance de alcançar 20@ antes de completarem 24 meses.
Outra vantagem de confinar a recria é a possibilidade de adquirir bezerros de reposição numa época de maior oferta e baixa procura. O início do período da seca é justamente quando temos a maior concentração de bezerros desmamados. É uma época em que o pecuarista está se desfazendo de animais, e não adquirindo novos, em razão da escassez de pastagem. Assim, quem recria em confinamento leva vantagem, pois pode comprar a reposição a preços mais baixos.
Uma outra vantagem diz respeito ao estresse da desmama, que tem impacto direto na perda de peso de bezerros. Em propriedades de cria que trabalham com uma estação de monta bem definida, a desmama ocorre no período da seca. Além da ausência da mãe, o bezerro tem um estresse a mais, pois vai para pastos com forragens de baixa qualidade. Já a recria confinada reduz esse efeito negativo, pois possibilita o fornecimento de uma dieta balanceada, com ingredientes de qualidade, com menor gasto energético, pois os animais caminham menos à procura de alimento. Há, ainda, a possibilidade de desmamar o bezerro já nas baias de confinamento, para que ele vá se adaptando ao ambiente quando for apartado da mãe.
Sobrepastejo evitado
De todas as vantagens, a garantia de que não haverá sobrepastejo no período de seca (o que permitirá o rebrote pleno das gramíneas no início do período chuvoso) é a que traz maior ganho econômico à propriedade. Devemos nos lembrar que o início do período chuvoso é crítico para a planta forrageira e para os animais. As chuvas geralmente são irregulares, e, quando o capim começa a rebrotar, os animais ficam ávidos por consumir as folhas novas, o que prejudica a recuperação da pastagem. Quando o gado está ausente na fase de rebrote, a planta cresce plenamente, preservando suas reservas energéticas. Quando se inibe o rebrote de capim com os animais nos pastos, a carga animal deve ser menor até o momento em que o pasto atinja sua plena capacidade. Isso tem efeito tanto na produtividade medida por arrobas produzidas por hectare, quanto no desempenho individual dos animais.
Diante desses argumentos, podemos afirmar – ainda que cause espanto – que é possível, sim, produzir, no período seco, uma arroba na recria confinada a um custo mais baixo do que a da recria a pasto. O contrário seria verdadeiro no período das águas, com pasto abundante e manejo adequado. Mas na seca, o baixo desempenho zootécnico eleva o custo da arroba. Veja, na tabela 2, como é possível garantir uma arroba a um custo inferior a R$ 120 por animal.
Para isso, porém, é essencial a produção de grande quantidade de volumoso a baixo custo. Se o planejamento nutricional para uma recria de bezerros em confinamento tem como meta um ganho de peso igual ao ocorrido a pasto no período das águas no verão, em torno de 750 gramas/dia, estabelecer dietas para ganhos superiores a esse é um dos principais erros, pois uma dieta de recria com nível energético elevado pode imprimir uma velocidade de ganho de peso maior. Só que, ao retornarem ao pasto, inevitavelmente, os animais reduzirão seu desempenho, e grande parte do resultado construído no confinamento poderá ser perdida.
Volumoso é fundamental
O desafio do nutricionista, portanto, é formular dietas com níveis semelhantes aos encontrados em um pasto de verão, tanto em energia quanto em proteína. Para isso, a dieta de recria deve conter uma grande quantidade de volumoso, podendo este chegar a 80% da composição nutricional. Volumosos com baixa energia, como silagens de capim e cana, feno, bagaço de cana e palhadas são excelentes alternativas. Talvez, aliás, seja este um dos principais gargalos desse sistema. Em uma dieta formulada só com silagem de capim, por exemplo, seria necessário algo em torno de 520 kg de matéria seca ou 2.000 kg de matéria original por bezerro em 120 dias de recria.
Um outro aspecto que não pode deixar de ser mencionado é a facilidade do manejo em comparação a um confinamento de engorda de bovinos convencional. O sistema de engorda em confinamento é muito mais “delicado” do que o de recria confinada, pois ali trabalhamos com dietas com densidade energética muito maior, com participação elevada de grãos (como, por exemplo, o milho), o que, dependendo da maneira como forem processados, podem gerar maior risco de problemas metabólicos, como a acidose. Já na recria confinada, por se tratar de uma dieta com elevada participação de volumoso e pouca participação de grãos, esse risco é reduzido.
Um outro diferencial é que podemos trabalhar com estruturas mais modestas e econômicas. Por exemplo, as estruturas de calçadas na frente dos cochos e bebedouros podem ser dispensadas, uma vez que a recria será feita somente na seca. Podemos, também, trabalhar com lotes maiores de bezerros, já que não se tem o impacto de perdas de desempenho por sodomia, por exemplo, além do fato de animais menores ocuparem menos espaço do que bois erados.
*Artigo originalmente publicado na edição 450 da Revista DBO.
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