Produtores mineiros criam alternativas para driblar a seca – Estado de Minas

Diante da estiagem, produtores rurais do Norte de Minas e do Vale do Jequitinhonha buscam opções, como a palma forrageira, para ajudar na alimentação dos rebanhos

(foto: Luiz Ribeiro/EM/D.A Press)
(foto: Luiz Ribeiro/EM/D.A Press)

Gilmar Caetano aposta na cobertura morta para reduzir o gasto de água e manter a atividade. Alimentar os animais no cocho, com silagem ou com palma, pode manter ganho de peso.

Montes Claros – As estiagens prolongadas castigam o Norte de Minas seguidamente. Diante desse quadro, os produtores rurais precisam criar meios para conviver com a seca, buscando alternativas para racionalizar o consumo de água, para manter a produção de alimentos, seja por meio da agricultura ou pela pecuária. Uma das opções encontradas é o cultivo da palma forrageira para complementar a alimentação do rebanho leiteiro no período crítico da seca, cujos efeitos também são sentidos no comércio na cidade, afetando duramente a economia regional.

A palma forrageira serve para alimentar bovinos, cabras e ovelhas, além de ajudar na hidratação dos animais, pois é constituída de 90% de água. A espécie já é muito usada no Nordeste e está sendo difundida no Norte de Minas e no Vale do Jequitinhonha por intermédio de projeto da Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado de Minas Gerais (Epamig), implementado em parceria com a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (Emater-MG), que visa ao fornecimento de mudas da planta para os pequenos agricultores, que também são capacitados para o cultivo.

O uso da planta começou a ser disseminado no semiárido mineiro há quatro anos. Já foram distribuídas cerca de 200 mil mudas (raquetes) para pequenos produtores de 27 municípios. “Quem recebia a palma firmava o compromisso conosco de, no primeiro ano de colheita, disponibilizar pelo menos 10% das mudas para outros produtores. Assim, fomos multiplicando a cultura na região, pois ela consegue aguentar os longos períodos de estiagem que estamos passando aqui”, afirma o coordenador técnico da Emater-MG em Janaúba, André Caxito.

Em nova etapa do projeto, financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig), está prevista a instalação, até setembro, de sete unidades demonstrativas da palma forrageira no Vale do Jequitinhonha, nos municípios de Leme do Prado, Minas Novas, Chapada do Norte, Berilo, José Gonçalves de Minas, Jenipapo de Minas e Francisco Badaró.

“Vamos capacitar os extensionistas da Emater para repassarem o conhecimento técnico em todas as unidades demonstrativas que plantarem a palma”, anuncia a pesquisadora Polyanna Oliveira, chefe da unidade experimental da Epamig em Nova Porteirinha (Norte de Minas). Lá estão sendo pesquisadas duas variedades da palma forrageira, a chamada palma gigante e a miúda ou doce. “Elas são totalmente diferentes, tanto em desenvolvimento quanto em tamanho da raquete e nutrientes. Queremos descobrir qual a melhor opção para a região, mas hoje trabalhamos mais com a palma gigante”, ressalta Polyanna.

PRODUTIVIDADE – 
A palma deve ser plantada 30 dias antes do início do período chuvoso e é colhida um ano após o plantio. “Depois disso, o produtor tem palma o ano inteiro, e não precisa esperar o período da seca para utilizá-la”, explica André Caxito. Muito resistente ao clima árido, com custo baixo e necessidade de pouca água, a espécie pode alcançar uma produção de até 120 toneladas por hectare. Essa quantidade é suficiente para alimentar 10 vacas leiteiras em produção durante oito meses, segundo a Emater-MG. “Muitas vezes, o produtor planta milho ou sorgo, mas a estiagem entre uma chuva e outra o faz perder a lavoura e ter prejuízos. A palma aguenta essas condições”, afirma Jair Mendes,  técnico da Epamig no Campo Experimental de Acauã (Vale do Jequitinhonha).

Apesar de oferecer muita água e ser fonte de energia para o animal – podendo substituir em até 70% a energia fornecida pelo milho –, a palma tem baixo teor de fibra, proteína e matéria seca. Dessa forma,  ela não deve ser usada como única fonte de alimento para os bovinos, e sim como complementação da dieta. “É necessário compensar a baixa quantidade de proteína. A palma pode participar em até 50% da matéria seca da alimentação dos animais, combinada com outro volumoso, como, por exemplo, silagem de sorgo, milho, milheto ou cana”, recomenda Jair Mendes.

A cultura foi adotada como alternativa para a convivência com a seca pelo produtor Uelton Moreira Cangussu, no município de Janaúba. Ele iniciou o cultivo há cinco anos em uma área pequena (pouco mais de meio hectare), onde plantou 4 mil raquetes. “A palma é uma cultura muito resistente à seca e tem um custo baixo”, afirma Uelton, que, satisfeito com o resultado, pretende dobrar a área plantada no próximo ano.

O pequeno agricultor disse que, agora que chegou o período mais crítico da seca, vai iniciar o corte da palma para alimentar suas 18 vacas de leite. Acrescentou que sua intenção é manter o rebanho com a alimentação alternativa até dezembro. “O paladar da palma é muito bom e o gado tem bom rendimento na produção de leite”, acrescenta.

Outro produtor norte-mineiro que recorreu à palma foi Amaral de Castro Oliveira, que cria gado de corte no município de Mamonas, um dos mais castigados pela estiagem na região. “Ninguém plantava antes, mas quando a seca pegou, todo mundo começou a apostar na palma. Tenho mais ou menos 1.400 raquetes plantadas, que me ajudam muito nas épocas piores de estiagem”, testemunha Amaral, que recebeu mudas da Epamig e assistência técnica da Emater-MG. Depois de três anos de cultivo, ele decidiu comprar uma máquina para cortar a palma.

Sem água, mais custos

A seca reflete diretamente no aumento de custos para o pecuarista Oswaldo Miranda, que tem uma criação de animais da raça nelore em sua fazenda, Estância OMJ, no município de Montes Claros. O produtor relata que, após quatro anos seguidos de estiagens prolongadas, se viu obrigado a investir na alimentação alternativa para manter o rebanho diante da falta de pasto, destruído pelo sol forte.

“O meu custo aumentou em cerca de 25% a 30%”, lamenta Miranda, que investiu em capineira e silagem para poder alimentar os animais na maior parte do ano. Ele explica que o custo de produção é variável. “No caso de um bezerro, que come menos, é menor. Mas, para manter uma vaca adulta, a despesa praticamente dobra”, ressalta o agricultor, que usa silagem de milho e sorgo.

A fazenda dele fica localizada em uma região de terras férteis, na beira do Rio Verde Grande. Mesmo assim, a maior parte da pastagem foi devastada pela escassez de chuvas. Atualmente, ele conta com cerca de 100 bezerros que são alimentados com ração, presos no curral, como se estivessem no sistema de confinamento, embora a criação seja do sistema extensivo (pastagem).

Oswaldo Miranda destaca que “colocar o gado no cocho” foi a única maneira que ele encontrou para se manter na atividade e evitar prejuízos ainda maiores com a perda de animais.

O pequeno agricultor Gilmar Leite Caetano, de 44 anos, fez algumas inovações no plantio de hortaliças no seu sítio, na comunidade de Abóboras/Serra Velha, no município de Montes Claros. O objetivo dele: gastar menos água e conviver com a seca. “Temos que nos adaptar à severidade da crise hídrica”, afirma Gilmar. Ele retira água do Rio São Lamberto, que está minguado. “No ano passado, o rio cortou e a água ficou somente em alguns poços”, conta.

O pequeno produtor recorre a variedades resistentes à falta de chuvas e adota técnicas para economizar água. Uma delas é o uso da chamada “cobertura morta”, matéria orgânica como capim e folhas secas nos canteiros de alface e alho. “A cobertura morta aduba a terra, cobre o solo e garante maior umidade, diminuindo o consumo de água”, explica Gilmar. Outra técnica adotada por ele é o plantio consorciado de couve, repolho, rúcula e outras hortaliças com banana. “As bananeiras fazem sombra e impedem que as plantações fiquem expostas ao sol o dia inteiro. Dessa forma, diminui a evaporação e dá para economizar água”, explica o sitiante.

Respingos no comércio

A estiagem prolongada reflete diretamente na queda das vendas no comércio das cidades do Norte de Minas. Mesmo os comerciantes que trabalham com produtos e equipamentos que ajudam o agricultor a conviver com a falta de chuvas afirmam que “não ganham dinheiro com a seca”. Proprietário de uma loja de rações, defensivos, vacinas e outros produtos agrícolas em Montes Claros, João Newton Pereira Lopes explica que não tem lucros com a seca porque o fenômeno afeta a economia regional, diminuindo a circulação de dinheiro. “No geral, ao contrário de aumentar, as vendas diminuem e ficam dispersas. As consequências são ruins para todo mundo”, frisa.

Lopes afirma que, na verdade, procura orientar os produtores rurais nas ações para o convívio e superação dos efeitos da estiagem. “Ficamos apagando incêndio, na tentativa de impedir perdas maiores. Por exemplo, se chega um criador e diz que vai vender uma vaca magra, com prejuízo, a gente orienta que ele alimente o animal para engordá-lo e ganhar algum dinheiro”, explica.

Ailton Santos Souza, também dono de uma revenda de insumos, afirma que a estiagem prolongada afeta toda cadeia produtiva. “Se não tem pasto, toda a cadeia econômica do agronegócio desmorona”, diz. Etelmiro Mendes Rocha, dono de uma empresa que trabalha com ordenhadeiras mecânicas e outros equipamentos e materiais para pecuária observa que a produção de leite na região teve uma queda de 30%, por causa da seca. “Nossas vendas diminuíram na mesma proporção”, lamenta.

Fonte: Estado de Minas

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