Ontem (11), o governo decidiu anular o leilão do arroz de 300 mil toneladas de arroz, por suspeitas de irregularidades e conflitos de interesses.
A operação, que desde o início sofreu contestação do setor, culminou na saída de Neri Geller, secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, após a anulação.
A saída de Geller estaria ligada ao fato de seu ex-assessor na Câmara dos Deputados entre 2019 e 2020, Robson França, ter representado empresas vencedoras no leilão por meio da Bolsa de Mercadorias de Mato Grosso.
“Quem habilitava as empresas a participar do leilão era a Bolsa de Mercadorias de Mato Grosso e não a Conab, com isso, nós só sabíamos após o resultado quem a bolsa habilitou e quem venceu. Havia empresas que não contavam com capacidade financeira para operar um volume deste tamanho”, disse o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro.
A principal vencedora do leilão foi a empresa Wisley A. de Souza LTDA do Amapá, de nome fantasia Queijo Minas, arrematou 147,3 mil toneladas e receberia R$ 736,3 milhões do Governo Federal.
No entanto, a empresa com capital social de R$ 5 milhões, teve suas dados alterados antes do leilão. Até 24 de maio, a empresa tinha um capital de R$ 80 mil.
Devolução da MP 1.227
Ainda na terça-feira, o presidente do Congresso Nacional, o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), anunciou a decisão de devolver ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Medida Provisória (MP) 1.227, que restringe a compensação de créditos de PIS/Cofins,
Chamada de “MP do fim do mundo”, diversos setores se manifestam contra medida, em especial o agronegócio, que via no texto uma série de impactos na cadeia produtiva, em especial para as exportações.
Após a devolução ao presidente Lula, o presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), João Martins, comemorou a decisão. Martins se referiu a MP como inconstitucional e diz que o setor e os produtores poderiam dormir um pouco mais aliviados.
“Esperamos que o governo, qualquer que seja a medida ou projeto, antes dialogue com o setor produtivo, porque é ele que paga a conta e recolhe os impostos. Queremos o diálogo, para evitar impactos no bolso daquele que produz”, disse.
CNA fora das discussões do Plano Safra
Além disso, como o Money Times mostrou no começo da semana, a CNA não foi convidada como um dos membros do grupo que participa das discussões do novo Plano Agrícola e Pecuário.
Isso ocorreu em meio a notícias de um convite do presidente Lula ao MST (Movimento dos Trabalhadores sem Terra) para as discussões do programa.
Guilherme Rios, assessor técnico da Comissão Nacional de Política Agrícola da CNA, ressaltou que a entidade enxerga o novo Plano Safra com incerteza e desconfiança.
“Chegamos a ir ao Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), conversamos com a secretaria que trata especificamente de crédito e entregamos as nossas propostas, que conta com um capítulo exclusivo para agricultura familiar. Nos colocamos à disposição e realmente não fomos convidados para participar dessa construção”, disse.
“Por mais que a gente tenha um volume robusto anunciado, mesmo que eles atendam, por exemplo, a nossa solicitação de R$ 570 bilhões, a nossa preocupação é se, de fato, esse recurso vai chegar na mão do produtor e em quais condições que vai chegar”, afirmou.
Ministério da Agricultura vive crise?
O cientista político e professor do Insper, Leandro Consentino, ressalta as dificuldades do Governo em se articular politicamente e socialmente com diferentes setores, em especial o agronegócio.
“O Ministério da Agricultura conta com desafios pela tragédia climática no Rio Grande do Sul, que responde por 70% da produção de arroz, e a partir disso foi realizado esse leilão que foi muito mal conduzido e contou com suspeitas de contrariedade no interesse público”, disse.
Ele lembra que o episódio custou o cargo do secretário de Política Agrícola num momento crucial, às vésperas do Plano Safra. “Fora isso, a MP 1.227 colocou ainda mais tensão no setor.”
Consentino enxerga problemas estruturais no Governo Lula 3 com o agronegócio, mas ressalta que o setor teve bons momentos com Lula entre 2003 e 2006, quando Roberto Rodrigues esteve à frente da agricultura.
“O Ministério está numa berlinda em um momento crucial para o Plano Safra, com muitos já criticando o novo programa antes mesmo dele ser lançado, o que mostra que isso não é uma crise fácil e exige articulação política.”
Para José Luiz Tejon, professor e coordenador do MBA Internacional Agro na França, a ideia do leilão do arroz, que ele considera como esdrúxula, surgiu apenas como uma propaganda para o Governo Federal, em meio a um momento extremamente delicado para o Rio Grande do Sul.
“Gostaria de saber quem teve essa ideia original. É importante elucidar que há normalidade no fluxo de importação-exportação. Inclusive, no caso do arroz. O Paraguai, por exemplo, exporta 80% dos seus volumes ao Brasil. Foi um erro que gerou múltiplos erros.”, diz.
“Tudo isso tira o foco do principal tema do agronegócio brasileiro, que é o Plano Safra. O RS, por sinal, precisa de medidas específicas no programa. O presidente da República deveria se manifestar e admitir o erro que foi essa decisão pelo leilão, com fins de propaganda em um momento em que toda propaganda deveria ser voltada a solidariedade e resgate da produção gaúcha”.
Por: Moneytime